Trilha de um filme imaginário (por ACM*)

O instrumentista fora de série vem sendo reconhecido há quatro décadas, em discos e shows junto a nomes como Tim Maia, Cassiano, Banda Black Rio, Cazuza, Marina Lima e Ed Motta. Já o compositor, inventivo e lúdico, começou a despontar ao lado de Tim Maia – contribuindo para algumas faixas do disco “Racional”, em 1975 – e, depois, desenvolveu sua marca nos discos solo. Identidade que deu as caras mesmo a partir de 2005, quando lançou seu segundo CD, “The Very Very Cool Cool Band”, seguido três anos depois pelo também muito muito bacana “Trans Space”, com uma nova formação da Very Very Cool Band.

Agora, em “Romantic lovers (Sparkling guitars from Paulinho Guitarra)”, esse nativo de Niterói apresenta mais um surpreendente trabalho autoral e instrumental.

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Nesse que é seu quarto disco solo, e o terceiro pelo seu próprio selo, Very Cool Music – ele estreou em 1991, com “Paulinho Guitarra” (Niterói Discos) -, Paulinho cuidou praticamente de tudo: guitarras, guitarras slide, baixo e, através de uma guitarra midi, sons de vibrafone, órgão e piano elétrico. Apenas a bateria ficou nas (boas) mãos de outro, o também técnico de gravação e assistente de produção Augusto Feres (que ainda cuidou do baixo com fuzz nas faixas “Ela é Alucicrazy!” e “Acorda, amorzinho!”); enquanto em “Blues for Y’all” conta com a participação do homenageado nesse tema, Otávio Rocha (o slide guitarrista do grupo Blues Etílicos).

Num projeto que diz ter feito em casa, “de chinelo e pijaminha”, e amorosamente dedicado à companheira de casa e trabalho e arte Jane Lapa, Paulinho revira as suas ricas referências musicais, num coquetel que vai da surf music instrumental do início dos anos 60 (The Ventures) ao jazz de John Coltrane e Miles Davis, passando por Beatles, Stones, Steely Dan, Hendrix, Mancini, Ed Motta, Quincy Jones… O resultado é delicioso, detalhista, mas feito com prazer e senso de humor. Daí “Romantic Lovers” soar como a trilha sonora de um filme que reúne 12 curtas – ou 13, já que a faixa 11 é um díptico sonoro, com “Boa noite Cinderela” e “Acorda, amorzinho!”. A

associação com o cinema – num filme sem imagens, mas que surgem na mente de cada ouvinte em tempo real – é uma das formas de viajar por esse disco recheado de estímulos sonoros. Um neologismo criado por Paulinho para o título do sexto tema, “Os sintônicos”, é outra chave de acesso, sintetizando o pensamento musical desse guitarrista, compositor, arranjador, que cria para “pessoas em sintonia!”.

Portanto, boa conexão e boa sessão.

* Antônio Carlos Miguel (especializado em música desde que se entende como jornalista, ACM atua nessa área desde os anos 70, é autor do livro “Guia de MPB em CD”, membro votante do Grammy Latino, do conselho e do júri do Prêmio de Música Brasileira)

PS: além de “me hospedar” (copyright Ezequiel Neves) numa versão digital de “Romantic lovers” enviada por Jane e Paulinho, ele me passou uma bula do disco que compartilho aqui.